Por que você deve pensar bem antes de emprestar seu veículo?
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Permitir, entregar e confiar são formas de deixar que alguém conduza seu veículo. Na condição de proprietário (para Sistema Nacional de Trânsito e o CTB proprietário não é necessariamente dono do veículo, mas quem o nome consta no RENAVAM como proprietário), emprestar o veículo pode trazer problemas. Neste texto, divididos em duas partes, vamos enumerar situações (e não são poucas) em que o proprietário será chamado a responder administrativamente e até penalmente:
✓ Se o condutor cometer infrações no veículo, a responsabilidade administrativa pelo pagamento da multa é sempre do proprietário (art. 282, § 3º, Código de Trânsito Brasileiro), mesmo que o condutor seja o responsável pelo cometimento da infração e seja ele penalizado com pontos na CNH.
✓ Se cometida infrações de atos praticados na direção (responsabilidade do condutor), porém sem este ter sido identificado pelo agente fiscalizador, a responsabilidade pela indicação do real infrator é do proprietário (artigo 257, §7°, CTB). Não indicando o condutor dentro do prazo e na forma prevista na resolução 918/22 do CONTRAN, o proprietário passará a ser considerado o responsável pelo cometimento da infração (art. 7º, Res. 918/22), isto é, terá a pontuação ou suspensão da CNH (conforme o caso) aplicado a si, ficando impune o condutor infrator.
✓ Se o proprietário entregar (está junto no veículo) ou permitir (não está junto no veículo) condutor sem este ser habilitado, com CNH cassada ou suspensa, dirigindo veículo que exige categoria de habilitação diversa da que possui, ou CNH vencida há mais de 30 dias, ou que não observe as restrições impostas em razão da saúde (como adaptações necessárias a conduzir o veículo), bem como no caso de condutor que não tenha realizado os cursos obrigatórios (seja os cursos especializados, seja o de reciclagem de infratores, por exemplo) será o proprietário autuado pelos artigos 163 ou 164 cuja penalidade são as mesmas do condutor que dirige nessas condições acima mencionadas (incisos do artigo 162 do CTB).
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✓ Em algumas Unidades da Federação, o DETRAN respectivo aplica a autuação do artigo 162 (conduzir o veículo) ao proprietário que, não tendo habilitação, estando com esta suspensa/cassada, etc. (incisos já mencionados.no item anterior) deixa de indicar o condutor infrator. Como se trata de responsabilidade do proprietário do veículo, presume-se que a não indicação do condutor representa a afirmação de que quem conduzia o veículo durante o cometimento da infração original era o próprio proprietário (e por isso não indicou outra pessoa). Ex: proprietário não possui habilitação, permite que alguém conduza e este condutor comete infração de excesso de velocidade (incisos do artigo 218), porém o proprietário não indica o condutor no prazo (atualmente deve ser concedido, no mínimo, 30 dias após a notificação para fazer a indicação, conforme caput do artigo 281-A, do CTB), logo, assim que o sistema constata a inércia do proprietário, haverá a lavratura de novo auto de infração no artigo 162, I (dirigir sem possuir habilitação). No RS é fácil identificar esse caso: o DETRAN gaúcho lavra o auto de infração sempre às 15 horas. Tal previsão existe apenas em Resolução do CONTRAN (a já mencionada 918/22) e ainda não é questão pacificada. Inclusive apelidou-se esse tipo de autuação de infração presumida ou multa virtual.
✓ Se o proprietário permite alguém que não é habilitado ou está com a habilitação suspensa/cassada (incisos I e II do artigo 162), também responde por crime de trânsito. O artigo 310 do CTB responsabiliza penalmente com detenção de 6 meses a 1 ano ou multa, quem permite, entrega ou confia a direção a condutor nessas condições e, mais, também se o condutor estiver embriagado (o que é interessante, pois a condição de embriaguez do condutor não está no artigo 162, mas no 165). Importante destacar que configura o crime do artigo 310 a mera conduta de entregar, permitir ou confiar a direção, ainda que o condutor possa não estar cometendo o crime do artigo 309 (dirigir sem habilitação ou com esta cassada gerando perigo de dano). É o entendimento sedimentado pela Súmula 575 do Supremo Tribunal de Justiça (STJ).
✓ Ainda sobre a embriaguez, emprestar veículo a condutor que mesmo habilitado está impossibilitado de conduzir com segurança por estado físico ou psíquico alterado é infração de trânsito administrativa do artigo 166 (Gravíssima, com penalidade de Multa) para o proprietário. Não se confunde com os incisos do artigo 162, que são mais específicos e relacionados a infrações sobre a habilitação. No artigo 166 podemos ter tanto um condutor que está sob influência de álcool, até mesmo alguém que esteja passando mal, dirigindo com sono, ou temporariamente impedido devido estar com braço ou perna quebrados, dentre outras situações que não ensejam nas condutas do artigo 162.
✓ Existe o risco de se instaurar processo de cassação da CNH, isso porque o artigo 263, II do CTB prevê tal penalidade para a reincidência nos artigos 163 e 164. A reincidência é considerada, nesses casos, dentro de 12 meses. Perceba que a prática de infração de entregar (163) ou permitir (164) numa primeira ocorrência gera multa e 7 pontos na CNH do condutor, além de responder por crime do 310, se habilitado. Na segunda ocorrência, desde que dentro de 12 meses, gera a cassação da CNH do proprietário.
Quer mais motivos que isso? Além de tudo o que foi mencionado, há que se destacar a possibilidade de responder civilmente por danos causados em decorrência da condução do veículo que esteja em má condições de segurança. Ex: você é proprietário de um veículo cujos pneus já atingiram a marca do TWI, ou seja, estão "carecas", mas permite/entrega a direção deste mesmo assim a um condutor que, conduzindo o seu veículo, se envolve em sinistro decorrente de deslizamento/derrapagem de pneus, justamente por estes estarem inadequados. Segundo Sampaio Fuga (2015, p. 65, "Acidentes de trânsito: responsabilidade civil e danos decorrentes", editora Boreal), "o proprietário do veículo é, certamente, responsável pelos danos causados quando seu carro é dirigido por outra pessoa ou por ele mesmo."
E no caso de ser o proprietário, porém não conduz o veículo e sim outra pessoa da família, alguém próximo de confiança é quem usa constantemente o veículo, qual a saída? O Código de Trânsito Brasileiro prevê no parágrafo 10 do artigo 257 que o proprietário registre no DETRAN o principal condutor (claro, este deve aceitar a indicação). Nesse caso, constará no registro o proprietário e o principal condutor. Qual a vantagem? Caso o proprietário deixe de indicar o condutor infrator, o sistema automaticamente irá impor ao principal condutor registrado a responsabilidade por infrações praticadas na direção (as de responsabilidade do proprietário que dizem respeito às condições de trafegabilidade e documentação do veículo permanecem sendo do proprietário). Assim evita-se a "multa presumida" mencionada anteriormente.
Outra obrigação é o proprietário manter atualizado o endereço de registro do veículo, pois é neste que as notificações de autuação serão enviadas. Em tempos de dificuldade e atrasos na expedição ou entrega das notificações, a melhor saída para evitar dor de cabeça é baixar o aplicativo Carteira Digital de Trânsito no seu smartphone ou acessar regularmente o site do DETRAN do Estado em que o veículo está registrado/emplacado para verificar a presença infrações e não perder prazo para indicar condutor ou mesmo apresentar defesa e recursos.
Fique atento! Ser proprietário de um veículo é muito mais que apenas adquiri-lo e pagar o licenciamento anual. Envolve a responsabilidade pelo que ocorre no veículo e por quem o conduz. Evite emprestar veículo, mas na necessidade, faça com inteligência e tenha sempre em mãos as dicas acima.
A divulgação deste texto é estimulada e permitida, DESDE que mantida a fonte de autoria (sob pena de responsabilidade civil e penal de quem não o fizer).