Blog

3 Teses contra o artigo 165-D - Multa automática

Desde maio de 2024, conforme escalonamento definido pela Lei nº 14.599 de 19 de junho de 2023 e trazido pela Deliberação do CONTRAN nº 272/24, milhares de condutores em pelo menos três estados do país (até a redação deste texto, Minas Gerais, Bahia e Amazonas já iniciaram as atividades) estão sendo autuados por cometimento da infração do artigo 165-D do Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.503/97).

Mas o que trata este artigo? Antes de mais nada, caro leitor, você precisa saber basicamente o que é o exame toxicológico, a quem é exigido e, por fim, qual é a famigerada infração apelidada de “multa automática”.

O exame toxicológico é um teste laboratorial com janela de detecção mínima de 90 dias para a identificação de consumo de substâncias psicoativas classificadas como proibidas, por exemplo cocaína, maconha, ecstasy, etc.

Ele é exigido, dentro da legislação de trânsito, a todos os condutores habilitados na categoria C, D ou E, mesmo que não exerçam atividade remunerada com o veículo, conforme prevê o art. 148-A do CTB. Estes condutores devem realizar o exame sempre que forem renovar a habilitação ou mudar para uma dessas categorias acima, além do exame teórico periódico a cada dois anos e seis meses (art. 148-A§ 2ºCTB).

Diante desse panorama, podemos adentrar na esfera da penalidade àquele que não realiza o exame periódico.

Importante destacar que o tema é bastante amplo e complexo. Há três artigos que tratam das infrações: art. 165-B, 165-C e 165-D, sendo que são quatro as fichas de fiscalização que vieram ao mundo através da resolução nº 1.009 de 24 de abril de 2024 editada pelo CONTRAN (Conselho Nacional de Trânsito). Portanto, cada uma das quatro infrações mereceriam um texto específico, tamanha a distinção entre si (por isso temos um curso específico voltado ao estudo das infrações e a fiscalização do exame).

Vamos nos atentar no artigo 165-D que traz a seguinte redação:

 

Art. 165-D. Deixar de realizar o exame toxicológico previsto no § 2º do art. 148-A deste Código, após 30 (trinta) dias do vencimento do prazo estabelecido: (Incluído pela Lei nº 14.599, de 2023)

Infração - gravíssima; (Incluído pela Lei nº 14.599, de 2023)

Penalidade - multa (cinco vezes). (Incluído pela Lei nº 14.599, de 2023)

Parágrafo único. A competência para aplicação da penalidade de que trata este artigo será do órgão ou entidade executivos de trânsito de registro da Carteira Nacional de Habilitação do infrator. (Incluído pela Lei nº 14.599, de 2023)

Como é possível depreender da leitura, a infração direciona-se ao condutor que não realizou o exame periódico e este venceu mais de 30 dias. Inclusive, conforme o parágrafo único, a competência para a aplicação da penalidade será do DETRAN do estado em que a CNH está registrada.

Isso quer dizer que não se trata de uma infração constatada na direção do veículo (como ocorre nos demais artigos já mencionados), nem no momento da renovação (como queria o legislador anteriormente com a antiga redação do parágrafo único do artigo 165-B, já alterado), mas sim de forma informatizada, via sistema.

Só isso já causa estranhamento, por ser uma inovação trazida ao espectro punitivo das infrações de trânsito. Porém, o maior estranhamento refere-se aos elementos definidos pelo CONTRAN na ficha de fiscalização deste artigo e que estão sendo ignorados pelos órgãos que, até o momento, iniciaram as autuações.

Não há como nem é nossa pretensão esgotar todas as teses possíveis neste texto, mas mostrar algumas incoerências, para dizer o mínimo, que são facilmente encontradas nas autuações e respectivas notificações que já foram encaminhadas a dezenas de milhares de condutores.

Algumas teses possíveis

É imprescindível observarmos as determinações da ficha de fiscalização. Se você não é familiarizado com as fichas, entenda que se tratam de um fichamento criado pelo CONTRAN e que vinculam todos os órgãos do Sistema Nacional de Trânsito e trazem os critérios, procedimentos e demais informações necessárias para a correta lavratura de um auto de infração de cada dispositivo previsto no CTB e que levam à punibilidade do infrator.

A Res. 1009/24 já mencionada trouxe a ficha do artigo 165-D e podemos identificar, neste texto, ao menos três elementos que são obrigatórios constar na autuação e sua respectiva notificação e que a experiência recente nos tem mostrado que não estão sendo observados:

1 - A data da infração

Sem querer nos alongar muito, é importante saber que a data do cometimento da infração está definida pelo CONTRAN através da Deliberação 272/24, que criou um escalonamento (determinado pela lei nº 14.599/23) e determinou o início da fiscalização a partir de 1º de maio aos condutores cuja CNH vencem entre os meses de janeiro e junho e 31 de maio para os que vencem a CNH entre julho e dezembro. O que se observa são os DETRAN lavrando o auto de infração com data posterior a esses prazos, como, por exemplo, 15 de maio.

Em que pese a própria ficha prever que a lavratura ocorra até 30 dias do cometimento, desde que a notificação de autuação seja expedida em até 30 dias, é inquestionável que a autuação deveria ocorrer no momento da infração, isto é, na data que se efetivamente cometeu a infração (31º dia após a data do vencimento do exame toxicológico).

2 - A ausência de informações

Outro aspecto que é facilmente observado nos documentos que são enviados aos condutores é a ausência de informações sobre o exame no campo Observações. Tanto o auto de infração quanto a notificação de autuação possuem o campo dedicado ao incremento de informações necessárias para a correta caracterização da infração.

O CONTRAN, sabiamente, diga-se de passagem, determina na ficha de fiscalização que esteja consignado nesse campo (e em nenhum outro) a data da última realização do exame periódico ou, naqueles casos em que não fora realizado nunca, a informação de que não consta dados da coleta. Ora, isso é imprescindível para que se saiba se o condutor cometeu ou não a infração, para o próprio ter ciência de quando realizou (se realizou) o último exame.

3 - Inconsistência nas datas

A Lei nº 14.599/23 determinou que os condutores sejam alertados, através do aplicativo Carteira Digital de Trânsito, do vencimento do seu exame, com pelo menos 30 dias de antecedência. Ocorre que têm chegado a nós muitos condutores que receberam a comunicação, por exemplo, informando prazo até 30 de maio para a regularização do exame, mas no dia 15 desse mesmo mês já foram autuados no artigo 165-D. Eis mais um flagrante, e na nossa opinião está entre os piores, da ilegalidade e irregularidade das autuações.

 

Considerações

Como pudemos perceber, ainda que exista a previsão legal (art. 148-A e 165-D) no CTB e a resolução que regulamentou a fiscalização (Res. 1.009/24), os órgãos estaduais, ao menos aqueles que já tivemos acesso às notificações, não estão atendendo às determinações legais.

Como vimos nos exemplos de nulidades trazidas acima, a sanha arrecadatória e punitiva tem falado mais alto (ao contrário de DETRANs dos estados do Paraná e Santa Catarina que editaram resolução suspendendo a aplicação da autuação do artigo 165-D até esclarecimentos do CONTRAN e SENATRAN sobre a série de dúvidas e incongruências).

Por isso que muitos condutores estão buscando seus direitos e muitos profissionais que defendem condutores estão atacando as autuações desse artigo em absolutamente todos os DETRAN que já colocam em prática essa fiscalização. Munido dessas teses e de mais de outras dez é que criamos o único curso totalmente voltado às teses contra o artigo 165-D. Se você chegou até aqui é porque provavelmente ou foi autuado ou é profissional com clientes batendo à sua porta e você procura uma forma de ajudá-los. O curso é a melhor ferramenta para você e que traz, além do conteúdo teórico, modelo de uma defesa de um dos casos que trabalhei.

Clique aqui e conheça mais sobre o curso "Teses contra o art. 165-D".

O bom profissional está preparado para enfrentar os abusos do Estado, mesmo quando ainda incipientes, mas, como visto, já produz efeitos danosos aos cidadãos.

Siga-nos nas redes sociais @cadoretransito e no Youtube no canal Cadore Trânsito.

 

Eduardo Cadore é Bacharel em Direito, Especialista em Direito de Trânsito, professor da Pós Graduação de Direito de Trânsito da Faculdade Legale, Professor de cursos de processo administrativo de trânsito na Prioritá Cursos Jurídicos, Professor de Legislação de Trânsito da APETRANS e dos cursos de formação de Instrutores de Trânsito da Universidade Regional Integrada - URI campus Santiago/RS. É Observador Certificado pelo Observatório Nacional de Segurança Viária. Apresentador do canal da UNICFC sobre legislação de trânsito. Instrutor de Trânsito e Psicólogo Especialista em Psicologia do tráfego.

Mais Publicações